Destaques Arquivo MPR #41

«Senhor Presidente», assim começa a carta que Egas Moniz endereçou a Sidónio Pais a 6 de março de 1918.

O já então distinto médico aceitara, pouco antes, mas com alguma relutância, a nomeação para ministro plenipotenciário (embaixador) de Portugal em Madrid.

Nesta primeira missiva enviada da capital espanhola, Egas Moniz dá conta da sua chegada à legação portuguesa, partilhando algumas das questões que o apoquentavam, como a necessidade de se negociar com Espanha o aproveitamento da bacia do Douro para a produção de energia elétrica, projeto de grande importância para «o desenvolvimento dos dois povos», defendia.

Não era a primeira vez que o então Presidente da República e o neurologista se cruzavam: em comum, a passagem, anos antes, por Coimbra, onde se formaram e exerceram a docência, mas também pela Assembleia Nacional Constituinte, para a qual foram eleitos deputados em 1911.

Quando, a 5 de dezembro de 1917, Sidónio Pais encabeçou um golpe que destituiu o governo e o Presidente Bernardino Machado, Egas Moniz, então líder do Partido Centrista, manifestou publicamente o seu apoio ao movimento militar (o Partido Centrista viria a dissolver-se, em abril de 1918, no Partido Nacional Republicano de Sidónio Pais).

Em maio de 1919, meses depois de Sidónio Pais ter sido assassinado (14 de dezembro de 1918), Egas Moniz escreveria estas palavras sobre o falecido Presidente: «O dr. Sidónio Pais era uma alta individualidade (…) Nem sempre estive de acordo com o Chefe da revolução de Dezembro (…) Fui, d’entre aqueles que o seguiram, um dos raros que ousaram discordar da sua orientação e fui (…) aquele que mais decididamente se manteve no seu posto, não transigindo. Mas, por isso mesmo, sobra-me autoridade para dizer que o dr. Sidónio Pais era um estadista no verdadeiro sentido da palavra» (in «Um Ano de Política»).

Foi curta a estada de Egas Moniz à frente da embaixada em Madrid – deixando a cidade em julho desse mesmo ano de 1918, para o período de vilegiatura, não mais voltou para retomar o cargo.

A 8 de outubro, foi nomeado secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros*, depois da muita insistência de Sidónio Pais, assumindo, após o Armistício (11 de novembro de 1918), a presidência da Delegação Portuguesa à Conferência de Paz de Paris.

A 16 de março de 1919, ao ser substituído na Delegação por Afonso Costa, Egas Moniz pôs um ponto final na sua incursão pela vida política, dedicando-se em exclusivo à Ciência e à Medicina: a ele se deve a invenção da angiografia cerebral e da leucotomia pré-frontal (também conhecida como lobotomia), descoberta esta que lhe granjeou o Prémio Nobel em 1949.

* Durante o regime de Sidónio Pais, os ministros eram designados «secretários de Estado».

RC

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Carta enviada por Egas Moniz ao Presidente Sidónio Pais, relatando a sua chegada à legação de Portugal em Madrid (primeira página). Reportagem da «Ilustração Portuguesa» sobre a nomeação de Egas Moniz como embaixador de Portugal em Espanha. Sidónio Pais (primeira fila, fardado) dirige-se a Egas Moniz, deputado e líder parlamentar da maioria sidonista, na cerimónia de abertura do Congresso. Egas Moniz, secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e presidente da Delegação Portuguesa à Conferência de Paz de Paris. A Delegação Portuguesa à Conferência de Paz de Paris. Da esquerda para a direita: Egas Moniz, Augusto de Vasconcelos, Alfredo Freire de Andrade, Espírito Santo Lima, Santos Viegas, Jaime Batalha Reis e Egas Alpoim. Entrega do Prémio Nobel em casa de Egas Moniz pelo ministro da Suécia em Portugal, Gustaf Weidel. O estado de saúde do médico português não lhe permitiu realizar a viagem até Estocolmo.