Últimas aquisições MPR #27
No lançamento do navio hidrográfico «D. João de Castro», em 1940, Américo Tomás recebeu um pequeno martelo de 8,5 cm, de prata e madeira. Foi uma cerimónia de grande pompa militar e contou com a presença do Presidente da República Óscar Carmona, ministros e mais entidades. A madrinha do navio foi Cesaltina Carmona e Costa, filha do Chefe do Estado.
O «D. João de Castro» foi o primeiro navio fabricado no Arsenal do Alfeite. O estaleiro tinha sido criado em 1937. Talvez por isso, a cerimónia teve grande aparato, como descreve o jornal O Comércio do Porto, de 23 de abril de 1940[1].
A partir do martelo principal, com 31 cm, hoje guardado no Museu de Marinha – possivelmente manuseado no ato do lançamento pelo Chefe do Estado –, terão sido feitas miniaturas para serem oferecidas às personalidades convidadas. Os martelos apresentam a seguinte inscrição: «1940», ao centro; «Arsenal do Alfeite - D. João de Castro», na orla.
«Fui com a família ao Alfeite assistir ao lançamento do “D. João de Castro”» – escreveu Américo Tomás na agenda pessoal, no dia 22 de abril de 1940. O arquivo do MPR guarda inúmeras agendas deste antigo Presidente. Estão disponíveis em linha porque passaram mais de 30 anos da sua morte, período legalmente previsto para o acesso livre.
Na cerimónia do lançamento do navio foram condecorados com o grau de Cavaleiro da Ordem do Mérito Industrial – chamada, no presente, Ordem do Mérito Empresarial – três operários do Arsenal: Manuel Pais Baptista, Luís Manuel da Costa e António Rodrigues Pereira. Terão recebido também o martelo miniatura do navio que ajudaram a construir?
Nessa altura, com o posto de capitão-de-fragata – equivalente a tenente-coronel do Exército –, Américo Tomás era chefe de Gabinete do ministro da Marinha, acumulando a presidência da Junta Nacional da Marinha Mercante. Há alguns anos que Américo Tomás desempenhava funções ligadas aos estudos hidrográficos e marítimos. Antes, tinha sido adjunto do presidente da Junta das Missões Geográficas e de Investigação do Ministério do Ultramar.
O navio «D. João de Castro» não teve vida longa, mas contou com algumas glórias, como a descoberta, em 1941, de um monte submarino que recebeu o seu nome: Banco D. João de Castro. De origem vulcânica, situa-se entre S. Miguel e a Terceira, no arquipélago dos Açores. É visível a 12 metros de profundidade e já formou uma ilha – a ilha Nova – aquando da atividade vulcânica do início do século XVIII. Desapareceu naturalmente, mas a cratera submarina continua lá, com cerca de 450 metros de diâmetro[2].
O «D. João de Castro» media 67 metros de comprimento e 10 de largura; comportava uma guarnição de 97 pessoas, entre oficiais, sargentos e praças. Segundo O Comércio do Porto, o navio custou 17600 contos – no tempo da moeda em escudos – e o autor do projeto foi o capitão-de-fragata Vasco Taborda Ferreira.
Numa missão científica, em 1947, encalhou próximo da praia do Penedo da Janela, ao largo da ilha de Santo Antão, no arquipélago de Cabo Verde. Não houve danos pessoais, mas o acidente tornou irrecuperável o navio. Dados georreferenciados confirmam a sua localização no fundo do mar.
Quem mais guardará martelos miniatura do «D. João de Castro»? Pelo menos o de Américo Tomás, Presidente da República entre 1958 e 1974, no período da Ditadura, guarda-se agora na coleção do MPR.
[1] Referido em: http://naviosenavegadores.blogspot.com/2014/04/o-nrp-d-joao-de-castro.html. Consulta de 9.10.2023.
[2] É possível fazer mergulho e observar o vulcão, a fauna e a flora (https://www.azoresgeopark.com/geoparque_acores/geossitios.php?id_geositio=56. Consulta de 9.10.2023).