«Foi uma honra lutar com os timorenses pelo direito e pela liberdade», declarou Jorge Sampaio, no dia em que Timor-Leste se tornou um país soberano e livre, a 20 de maio de 2002, na Cerimónia Bilateral Luso-Timorense, que teve lugar em Díli.
No Museu, encontramos um testemunho dessa cerimónia histórica, um presente de Estado oferecido pelo então Presidente da República timorense, Xanana Gusmão: em filigrana de prata, destaca-se pela sua delicadeza a Uma Lulik.
Em tétum, língua oficial daquele país, a par do português, a expressão significa «casa sagrada», onde uma corresponde a «casa» e lulik ao que é «sagrado».
Estas construções povoam todo o território de Timor-Leste e marcam profundamente a identidade cultural do país, sendo consideradas, pelas entidades oficiais, um símbolo nacional.
Na Uma Lulik encontram-se céu e terra, passado e presente, mortos e vivos. Espaço de culto dos antepassados, é nestas casas que se celebram as cerimónias e os rituais mais importantes de uma família: nascimentos, casamentos, mortes, Dia de Finados…
É, por isso, um lugar de memória, onde são guardados objetos sagrados, ou lulik, como os tais (panos tradicionais usados nas cerimónias), os surik (espadas rituais, que passam de geração em geração), as máscaras e estatuetas dos antepassados, os kaibauk (adornos de cabeça em forma de crescente lunar ou chifres de búfalo) ou as espigas de milho.
É diversa a tipologia das casas sagradas, dependendo da região onde se encontram e do grupo etnolinguístico a que pertencem.
No município de Lautém, no extremo leste da ilha, encontramos, provavelmente, a estrutura mais reconhecida: com telhado pontiagudo, elevado em relação à base, a casa assenta sobre quatro vigas de madeira, tal qual o presente de Estado aqui em destaque.
Manda a tradição que sejam construídas com recurso a materiais naturais, como o bambu, a madeira, as cordas vegetais ou o colmo. Toda a comunidade se envolve na sua edificação, que pode demorar meses ou mesmo anos.
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Além do telhado, que representa o Céu, destaca-se na sua estrutura o pilar ou poste principal, símbolo do eixo do mundo. As portas são ricamente decoradas, entalhada a madeira com motivos geométricos, antropomórficos e/ou zoomórficos.
No seu interior, a sempre presente lareira é o lugar junto da qual se realizam os rituais.
A inauguração da Uma Lulik é ocasião para reunir a família e agradecer aos antepassados, num cerimonial que contempla momentos como a transferência dos objetos lulik para o seu interior; as oferendas aos ancestrais (arroz, carne cozida, noz de areca, vinho); a refeição coletiva ou o sacrifício de animais.
A ocupação indonésia de Timor-Leste (1975-1999) levou à destruição e ao abandono da maioria das casas sagradas, facto que não deixa de ser curioso quando se descobre na bandeira da então província de Timor a representação da Uma Lulik.
A partir da década de 1990, e com mais afinco depois da independência, as casas sagradas têm vindo a ser reconstruídas pelas comunidades locais e continuam, hoje, a marcar a paisagem de Timor-Leste.