«Deve ser illuminada a luz electrica a cidadella de Cascaes, para solemnisar o anniversario de sua alteza o principe real. Os aparelhos (…) contratou-os o sr. conselheiro Nazareth expressamente em Paris, e são dos que iluminam a entrada da Opera, a sua avenida e a praça do theatro francez», anunciava o jornal Diário de Notícias, a 28 de setembro de 1878.

Celebrava-se, nesse dia, o 15.º aniversário de D. Carlos. O palco da festa seria o Palácio da Cidadela de Cascais, onde a família real costumava passar as últimas semanas da época de veraneio, antes do regresso a Lisboa.

Movido pela curiosidade e pelas notícias que chegavam de França, o seu pai, o Rei D. Luís, decidira instalar no exterior do Palácio seis candeeiros iguais aos que, uns meses antes, e por ocasião da Exposição Universal de Paris, tinham iluminado a Praça da Ópera daquela cidade.

A iluminação pública elétrica dava, então, os primeiros passos em Portugal.

Segundo o historiador João Figueira, não era a primeira vez, no entanto, que se «acendia a luz» em Portugal:  a partir de finais da década de 1860, e para assinalar ocasiões festivas, surgem experiências pontuais do uso da energia elétrica no espaço público, sempre de duração efémera, como em Coimbra (1867) ou em Lamego (1876).

Mas a experiência no Palácio da Cidadela de Cascais, talvez pela relevância e prolongamento no tempo («tem funcionado regularmente todas as noites», diria a revista O Occidente a 1 de novembro de 1878), acabaria por ser a que mais eco teve na imprensa e na sociedade.

Os candeeiros que José Duarte Nazareth, administrador da Fazenda da Casa Real, fez chegar de Paris traziam consigo a mais recente inovação na produção de luz artificial: as velas (ou lâmpadas) Jablochkoff, uma invenção que o engenheiro russo Paulo Jablochkoff (1847-1894) dera a conhecer dois anos antes, em 1876.

Estas velas de arco voltaico distinguiam-se das suas antecessoras por produzirem uma luz branca, muito intensa e encadeante, o que as tornavam ideais para a iluminação pública. Além do mais, o seu tempo de vida era superior, decorrendo cerca de 1h40 até ser necessário substituí-las: cada candeeiro poderia ter, por exemplo, quatro velas, o que permitia iluminar durante, aproximadamente, seis horas!

A simplicidade do funcionamento do sistema de Jablochkoff permitiu a sua rápida difusão por várias cidades da Europa (e não só), bem como o reconhecimento internacional do seu inventor: no pico do sucesso, chegaram-se a produzir 8000 velas por dia em França.

Terminada a época de vilegiatura, os candeeiros foram cedidos à Câmara Municipal de Lisboa, juntamente com o gerador móvel Gramme de 8 CV (cavalos-vapor) que os acompanhava, e instalados na zona do Chiado, perante o olhar espantado dos transeuntes, como o atesta estes versos publicados na imprensa da época:

«Agora, sim, povo amado / Que já tens um regabofe / Vinde à noite no Chiado/ Ver a luz do Jablochkoff / Luz, muita luz, luz imensa / É da ventura o princípio / Em ti, por fim alguém pensa / Já tem luz o município / (...) Gosa pois, ò povo amado / Gosa o grátis regabofe / vinde pasmar no Chiado / Ante a luz do Jablochkoff».

Finda esta experiência, seria preciso esperar mais dez anos para que a iluminação pública elétrica fosse definitivamente inaugurada no Chiado, Restauradores e Avenida da Liberdade (maio de 1889).

Em breve, a invenção de Jablochkoff soçobraria perante mais uma inovação técnica: a lâmpada incandescente que Thomas Edison apresentou na Exposição Internacional de Paris em 1881.

Hoje, desconhece-se o paradeiro dos candeeiros adquiridos por D. Luís, mas o gerador Gramme, utilizado na mesma ocasião, e encomendado à empresa Machine Gramme também em 1878, encontra-se à guarda do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa.

 

Saiba mais:

Figueira, João – A história da eletricidade em Portugal. Lisboa: CTT Correios de Portugal, 2018.

Guedes, Manuel Vaz – Um acendedor automático para velas Jablochkoff, consultado em https://paginas.fe.up.pt/histel/AcendedorAuto.pdf

Lisboa e a Eletricidade. Lisboa: EDP Eletricidade de Portugal, 1992.

Agradecemos ao Professor Pedro Fonte do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa as informações facultadas.

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O Palácio da Cidadela de Cascais, onde, a 28 de setembro de 1878, decorreu uma das primeiras experiências de iluminação elétrica em Portugal. Paulo Jablochkoff (também grafado Pavel Yablochkov), engenheiro russo que, em 1876, registou a patente da vela carbónica batizada com o seu nome. A Avenida e Praça da Ópera, em Paris, iluminadas pelos candeeiros com velas de Jablochkoff. Notícia da revista ilustrada «O Occidente», dedicada às velas de Jablochkoff, com referência à experiência ocorrida no Palácio da Cidadela de Cascais (primeira página). Notícia da revista ilustrada «O Occidente», dedicada às velas de Jablochkoff, com referência à experiência ocorrida no Palácio da Cidadela de Cascais (segunda página). A iluminação da Praça Luís de Camões, em Lisboa, durante as comemorações o tricentenário da morte de Camões. Na gravura, é possível identificar candeeiros com velas Jablochkoff, ao lado dos então tradicionais candeeiros a gás. Imagem gráfica do número 35 da rubrica mpr+.