Ao percorrermos a exposição permanente do Museu da Presidência da República, encontramos uma escultura em bronze de uma figura humana, que se apresenta sentada, com os cotovelos assentes sobre os joelhos, segurando a cabeça.
É o Pensador, um presente de Estado oferecido ao Presidente Aníbal Cavaco Silva em 2010, pelo Presidente José Eduardo dos Santos, durante uma visita a Angola.
O que alguns visitantes poderão não saber, é que este presente é uma interpretação de um dos maiores símbolos da cultura angolana.
O artista por detrás desta figura em particular é Mpambukidi Nlunfidi, nascido na província do Uíje em 1957, cujas esculturas podem ser encontradas em coleções em Angola e no estrangeiro, em países como os Estados Unidos, Itália ou Portugal.
Membro da União Nacional dos Artistas Plásticos, formou-se entre a República do Congo, o Gabão e Paris, e é um dos poucos escultores a trabalhar o bronze em Angola.
O Pensador, que tanto pode ser um homem como uma mulher, retrata o/a ancião/ã, o/a líder da comunidade, o/a guardião/ã das tradições e costumes, responsável pela sua transmissão às gerações futuras.
É, por isso, símbolo de sabedoria e autoridade.
Esteticamente, é a simetria e a harmonia das suas linhas que nos chamam a atenção, as quais se transfiguram na serenidade do gesto, na humanização da figura que, simplesmente, medita.
A sua origem estará nos Tshokwe (ou Chowke, Cowke), grupo étnico cuja população se concentra sobretudo no nordeste de Angola, afamados pela sua tradição artística, nomeadamente pelas suas esculturas e máscaras.
Da sua cosmologia, fazem parte os cestos de adivinhação, os Ngombo ya Cisuka, onde se encontram vários objetos, alguns esculpidos em madeira, outros de origem animal (patas, penas, chifres, etc.), todos com o seu valor simbólico, que, quando agitados, permitem ao adivinho determinar o futuro e a sorte do consulente.
O Kuku, ou Samanyonga, é um dos desses objetos: a estatueta de um/a ancião/ã a meditar tem o poder de invocar o espírito dos antepassados, de ser o intermediário entre vivos e mortos.
Terá sido em finais da década de 1940 que se esculpiram as primeiras figuras do Pensador, a partir da estatueta do Kuku, no Museu do Dundo, criado em 1936 pela então companhia de diamantes de Angola – a Diamang. Situado na província de Lunda Norte, agora museu nacional, foi o primeiro a ser construído em Angola e guarda uma importante coleção etnográfica representativa da região leste de Angola.
Da produção em pequena escala, passou-se à larga escala e, hoje, encontramos um pouco por toda a Angola representações do Pensador, em diferentes dimensões e materiais, frequentemente compradas como recordação de uma viagem àquele país.
Em 1984, foi-lhe conferido o estatuto oficial de símbolo da cultural nacional, uma sugestão do escritor Henrique Abranches (1932-2006).
Ela está sentada, a Mãe-Pensador.
Está cuidadosamente sentada
entre a vida e a morte,
para lá de toda a gente.
Ela está sentada,
A Mãe-Genitor,
sobre o seu andor.
Mas não como a Senhora dos ausentes.
Nem como a virgem dos doentes.
Nem como a Nossa Senhora das Dores.
Ela não tem nada, a Mãe-Pensador.
Não tem morte, nem vida
nem Sul, nem Norte
nem cima, nem baixo
nem cor… nem dó.
(excerto do poema O Pensador, de Henrique Abranches)
RC