João do Canto e Castro
Biografia
João do Canto e Castro foi eleito Presidente da República na sequência do assassinato de Sidónio Pais. A sua eleição seguiu o disposto na Constituição de 1911, ou seja, para cumprir o mandato presidencial de Bernardino Machado que havia sido deposto pela revolução sidonista.
Secretário de Estado da Marinha durante a Presidência de Sidónio Pais, o almirante Canto e Castro não escondera as suas convicções monárquicas que, contudo, não o impediram de defender a República durante os 294 dias em que foi Presidente da República.
João do Canto e Castro nasceu em Lisboa, em 19 de Maio de 1862, filho do general José Ricardo da Costa Silva Antunes, e de Maria da Conceição do Canto e Castro Mascarenhas Valdez.
Após ter frequentado o liceu no Colégio Luso-Britânico, iniciou, em 1881, a sua formação militar na Real Escola Naval.
Em 1891 casou com Mariana de Santo António Moreira Freire Correia Manuel Torres d'Alvim, de quem teve duas filhas e um filho.
Atividade Profissional
Terminada a Escola Naval, percorreu a via ascendente dos primeiros postos de oficial da Marinha; em Janeiro de 1891 era já primeiro-tenente, a prestar serviço na Escola dos Alunos Marinheiros, em Lisboa.
Em 1887 havia feito a sua primeira grande viagem, a bordo da corveta Bartolomeu Dias. A esta, outras se tinham seguido. Embarcou na corveta Estefânia, na fragata D. Fernando II, no transporte à vela África e nas canhoeiras Tâmega, Liberal e Zaire. Foi a bordo desta última que visitou Macau, Timor e Moçambique. Recebeu então o seu primeiro louvor concedido pelo comandante da Divisão Militar do Índico.
De março a novembro de 1890 exerceu funções de auxiliar técnico da Comissão de Limites do Congo. O seu desempenho valeu-lhe o grau de cavaleiro da Ordem da Estrela de África, atribuído pelo Estado Livre do Congo (após 1908 o Congo Belga), assim como o mesmo grau da Ordem portuguesa de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa.
Foi num contexto de grande instabilidade política e social, e no rescaldo da perda dos territórios que uniam Angola a Moçambique, mapeados à cor rosa (origem da designação que se generalizou, “mapa cor de rosa”) que Canto e Castro foi nomeado, em 1892, governador da então Lourenço Marques, atual Maputo.
Razões de saúde – uma primeira crise de angina de peito - forçaram-no a regressar à metrópole no ano seguinte. Recuperado, retomou as suas funções em 1894, assumindo o comando da cidade e defendendo-a dos ataques das populações africanas, ocorridos em setembro desse ano.
Após uma segunda grave crise de angina de peito, e já empossado como governador de Moçâmedes, no sul de Angola, foi agraciado - no início de 1896 - com o grau de cavaleiro da Ordem da Torre e Espada, sinal de reconhecimento da sua ação em Lourenço Marques. Ainda neste mesmo ano foi exonerado, a seu pedido, daquele lugar, regressando a Lisboa.
Em 1899 voltou ao mar para comandar a canhoeira Diu; em 1902 seguiu-se a canhoeira Vouga. Foi no comando desta última que conheceu o então guarda-marinha Jaime Athias.
Promovido a capitão-de-fragata em junho de 1910, passou a desempenhar o cargo de vogal da Comissão Técnica da Direcção-Geral da Marinha, função que ainda desempenhava aquando da implantação da República.
Em 7 de Novembro de 1910, o novo regime, na pessoa de Amaro Azevedo Coutinho, ministro da Marinha, nomeou João do Canto e Castro comandante da Escola de Alunos Marinheiros do Norte, com sede em Leixões, cargo que exerceu cumulativamente com a chefia interina do Departamento Marítimo do Norte. No desempenho desta função ocorreram cheias catastróficas no rio Douro. As operações de salvamento e proteção que comandou, valeram-lhe um louvor. Foi também nesta altura nomeado membro da comissão oficial encarregada de propor as bases da reorganização da Armada.
Em 1912 estreou-se na iniciativa privada com um negócio de comissões e consignações, cujo escritório sediou junto à Praça dos Restauradores. O objetivo seria abandonar a vida militar, mas o insucesso da iniciativa impediu-o.
Em meados de 1913 foi incumbido de se deslocar a Macau para aí assumir o comando do cruzador português Adamastor. Além de conhecer novas paragens, Alemanha, Rússia e China, contactou com duas figuras políticas com quem se viria a cruzar mais tarde, em circunstâncias bem diversas: Sidónio Pais, embaixador em Berlim, quando rumava a Macau, e Bernardino Machado, que recebeu Canto e Castro na qualidade de embaixador de Portugal no Rio de Janeiro, a bordo do cruzador na passagem pelo Brasil.
Em Julho de 1915 foi promovido a capitão-de-mar-e-guerra e nomeado de imediato comandante da Escola Prática de Artilharia Naval. Já após a instauração do sidonismo, foi indicado para o cargo de director dos Serviços de Estado Maior Naval, e em 28 de Dezembro de 1917 designado para elaborar um plano de melhoramentos da defesa do litoral português face a ataques dos submarinos alemães.
Carreira Política
Foi eleito deputado em 1908, no último Parlamento da Monarquia, dedicando-se especialmente à reorganização das Forças Navais.
A 9 de Setembro de 1918, e após várias insistências, tomou posse como secretário de Estado da Marinha. O pendor presidencialista de Sidónio Pais criou apenas secretários de estado; anulando a figura do ministro, sobrevalorizava-se claramente a magistratura presidencial.
Eleição
Assassinado Sidónio Pais no dia 14 de Dezembro de 1918, a eleição de João do Canto e Castro processou-se de acordo com as regras da Constituição de 1911, repostas após a rotura sidonista. Num complexo período do regime republicano, o seu mandato foi marcado por revoltas e tentativas de restauração monárquicas, bem como pela atribuição do poder de dissolução do Congresso ao Presidente da República.
Face ao desaparecimento de Sidónio Pais da cena política, João do Canto e Castro, homem de convicções monárquicas, foi eleito a 17 de Dezembro de 1918. O seu mandato visou concluir o mandato presidencial de Bernardino Machado. A eleição teve lugar no Parlamento de acordo com os princípios da Constituição de 1911 (repostos pela Lei n.º 833, de 16 de Dezembro).
Não foi uma escolha pacífica. Após a chamada para o primeiro escrutínio, ao qual responderam 134 congressistas, os monárquicos saíram da sala, entrando na urna 125 votos, que se distribuíram por: Canto e Castro, 121 votos; José Relvas, do Partido Unionista, 1 voto; Basílio Teles, candidato do Partido Republicano, 1 voto; Garcia Rosado, 1 voto; e um voto em branco. Procedeu-se a novo escrutínio. Canto e Castro obteve então 137 votos e registou-se um voto em branco.
Após a Presidência
Por proposta de Rocha e Cunha, ministro da Marinha, Canto e Castro, então contra-almirante, foi promovido ao posto de almirante, patente atribuída a título honorário. Pouco depois, o ministro da Guerra Hélder Ribeiro designou-o chanceler da Ordem da Torre e Espada. Desempenhou ainda o cargo de presidente do Conselho Superior de Disciplina da Armada.
No dia 30 de Setembro de 1932 passou à situação de reforma.
Faleceu em Lisboa a 14 de Março de 1934. Presentes no seu funeral estiveram algumas das figuras gradas ao novo regime instaurado em 1926, bem como o cardeal patriarca de Lisboa, Manuel Cerejeira, o representante da família real, João de Azevedo Coutinho, e elementos do corpo diplomático.
Biografia completa
João do Canto e Castro nasceu em Lisboa, em 19 de Maio de 1862, filho do general José Ricardo da Costa Silva Antunes, e de Maria da Conceição do Canto e Castro Mascarenhas Valdez.
Após ter frequentado o liceu no Colégio Luso-Britânico, iniciou, em 1881, a sua formação militar na Real Escola Naval.
Em 1891 casou com Mariana de Santo António Moreira Freire Correia Manuel Torres d'Alvim, de quem teve duas filhas e um filho.
Atividade Profissional
Terminada a Escola Naval, percorreu a via ascendente dos primeiros postos de oficial da Marinha; em Janeiro de 1891 era já primeiro-tenente, a prestar serviço na Escola dos Alunos Marinheiros, em Lisboa.
Em 1887 havia feito a sua primeira grande viagem, a bordo da corveta Bartolomeu Dias. A esta, outras se tinham seguido. Embarcou na corveta Estefânia, na fragata D. Fernando II, no transporte à vela África e nas canhoeiras Tâmega, Liberal e Zaire. Foi a bordo desta última que visitou Macau, Timor e Moçambique. Recebeu então o seu primeiro louvor concedido pelo comandante da Divisão Militar do Índico.
De março a novembro de 1890 exerceu funções de auxiliar técnico da Comissão de Limites do Congo. O seu desempenho valeu-lhe o grau de cavaleiro da Ordem da Estrela de África, atribuído pelo Estado Livre do Congo (após 1908 o Congo Belga), assim como o mesmo grau da Ordem portuguesa de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa.
Foi num contexto de grande instabilidade política e social, e no rescaldo da perda dos territórios que uniam Angola a Moçambique, mapeados à cor rosa (origem da designação que se generalizou, “mapa cor de rosa”) que Canto e Castro foi nomeado, em 1892, governador da então Lourenço Marques, atual Maputo.
Razões de saúde – uma primeira crise de angina de peito - forçaram-no a regressar à metrópole no ano seguinte. Recuperado, retomou as suas funções em 1894, assumindo o comando da cidade e defendendo-a dos ataques das populações africanas, ocorridos em setembro desse ano.
Após uma segunda grave crise de angina de peito, e já empossado como governador de Moçâmedes, no sul de Angola, foi agraciado - no início de 1896 - com o grau de cavaleiro da Ordem da Torre e Espada, sinal de reconhecimento da sua ação em Lourenço Marques. Ainda neste mesmo ano foi exonerado, a seu pedido, daquele lugar, regressando a Lisboa.
Em 1899 voltou ao mar para comandar a canhoeira Diu; em 1902 seguiu-se a canhoeira Vouga. Foi no comando desta última que conheceu o então guarda-marinha Jaime Athias.
Promovido a capitão-de-fragata em junho de 1910, passou a desempenhar o cargo de vogal da Comissão Técnica da Direcção-Geral da Marinha, função que ainda desempenhava aquando da implantação da República.
Em 7 de Novembro de 1910, o novo regime, na pessoa de Amaro Azevedo Coutinho, ministro da Marinha, nomeou João do Canto e Castro comandante da Escola de Alunos Marinheiros do Norte, com sede em Leixões, cargo que exerceu cumulativamente com a chefia interina do Departamento Marítimo do Norte. No desempenho desta função ocorreram cheias catastróficas no rio Douro. As operações de salvamento e proteção que comandou, valeram-lhe um louvor. Foi também nesta altura nomeado membro da comissão oficial encarregada de propor as bases da reorganização da Armada.
Em 1912 estreou-se na iniciativa privada com um negócio de comissões e consignações, cujo escritório sediou junto à Praça dos Restauradores. O objetivo seria abandonar a vida militar, mas o insucesso da iniciativa impediu-o.
Em meados de 1913 foi incumbido de se deslocar a Macau para aí assumir o comando do cruzador português Adamastor. Além de conhecer novas paragens, Alemanha, Rússia e China, contactou com duas figuras políticas com quem se viria a cruzar mais tarde, em circunstâncias bem diversas: Sidónio Pais, embaixador em Berlim, quando rumava a Macau, e Bernardino Machado, que recebeu Canto e Castro na qualidade de embaixador de Portugal no Rio de Janeiro, a bordo do cruzador na passagem pelo Brasil.
Em Julho de 1915 foi promovido a capitão-de-mar-e-guerra e nomeado de imediato comandante da Escola Prática de Artilharia Naval. Já após a instauração do sidonismo, foi indicado para o cargo de director dos Serviços de Estado Maior Naval, e em 28 de Dezembro de 1917 designado para elaborar um plano de melhoramentos da defesa do litoral português face a ataques dos submarinos alemães.
Carreira Política
Foi eleito deputado em 1908, no último Parlamento da Monarquia, dedicando-se especialmente à reorganização das Forças Navais.
A 9 de Setembro de 1918, e após várias insistências, tomou posse como secretário de Estado da Marinha. O pendor presidencialista de Sidónio Pais criou apenas secretários de estado; anulando a figura do ministro, sobrevalorizava-se claramente a magistratura presidencial.
Eleição
Assassinado Sidónio Pais no dia 14 de Dezembro de 1918, a eleição de João do Canto e Castro processou-se de acordo com as regras da Constituição de 1911, repostas após a rotura sidonista. Num complexo período do regime republicano, o seu mandato foi marcado por revoltas e tentativas de restauração monárquicas, bem como pela atribuição do poder de dissolução do Congresso ao Presidente da República.
Face ao desaparecimento de Sidónio Pais da cena política, João do Canto e Castro, homem de convicções monárquicas, foi eleito a 17 de Dezembro de 1918. O seu mandato visou concluir o mandato presidencial de Bernardino Machado. A eleição teve lugar no Parlamento de acordo com os princípios da Constituição de 1911 (repostos pela Lei n.º 833, de 16 de Dezembro).
Não foi uma escolha pacífica. Após a chamada para o primeiro escrutínio, ao qual responderam 134 congressistas, os monárquicos saíram da sala, entrando na urna 125 votos, que se distribuíram por: Canto e Castro, 121 votos; José Relvas, do Partido Unionista, 1 voto; Basílio Teles, candidato do Partido Republicano, 1 voto; Garcia Rosado, 1 voto; e um voto em branco. Procedeu-se a novo escrutínio. Canto e Castro obteve então 137 votos e registou-se um voto em branco.
Após a Presidência
Por proposta de Rocha e Cunha, ministro da Marinha, Canto e Castro, então contra-almirante, foi promovido ao posto de almirante, patente atribuída a título honorário. Pouco depois, o ministro da Guerra Hélder Ribeiro designou-o chanceler da Ordem da Torre e Espada. Desempenhou ainda o cargo de presidente do Conselho Superior de Disciplina da Armada.
No dia 30 de Setembro de 1932 passou à situação de reforma.
Faleceu em Lisboa a 14 de Março de 1934. Presentes no seu funeral estiveram algumas das figuras gradas ao novo regime instaurado em 1926, bem como o cardeal patriarca de Lisboa, Manuel Cerejeira, o representante da família real, João de Azevedo Coutinho, e elementos do corpo diplomático.
Mandato Presidencial
16 de dezembro de 1918 - 5 de outubro de 1919
No dia 15 de Dezembro de 1918 Canto e Castro assumiu a presidência do XVIII Governo da República, lugar que acumulou com a pasta da Marinha. Num primeiro momento procurou formar um governo de conservadores, não sidonistas, com o apoio do Partido Unionista. Goradas as expectativas, a tarefa de constituir um ministério foi entregue a Tamagnini Barbosa, ministro dos governos de Sidónio Pais. O novo executivo tomou posse em 23 de Dezembro de 1918. Fruto de compromissos à esquerda e à direita e com uma fraca representação militar, gerou desde logo descontentamento.
Os primeiros sinais de inconformismo face ao governo vieram dos comandos militares de Lisboa e do Norte.
A 23 de Dezembro de 1918 ocorreu a primeira tentativa de pronunciamento militar em Lisboa, protagonizada por João de Almeida, um militar monárquico comandante de Lanceiros 2. A intervenção do governo e do chefe do Estado conseguiu acalmar os ânimos e convencer os revoltosos a regressar aos quartéis.
A 3 de Janeiro de 1919 a Junta Militar do Norte deu também mostras de desagrado, proclamando-se representante e continuadora do projeto político sidonista.
Já antes da morte de Sidónio Pais, o governo havia perdido o controlo da situação em diversas partes do país. As Juntas Militares tinham sido criadas no Norte e no Sul com o pretexto de defender Portugal da "subversão" e de apoiar o Presidente contra os seus inimigos; na realidade tinham como propósito a proclamação da Monarquia. Com a morte de Sidónio, as Juntas ganharam protagonismo e aumentaram o seu poder, sobretudo no Norte. A pressão da Junta do Norte acabaria por conduzir, em 7 de Janeiro de 1919, a uma remodelação do executivo, traduzida no afastamento dos ministros da Justiça, da Guerra e do Trabalho.
Paralelamente em diversos pontos do país - Lisboa, Santarém e Covilhã - a oposição republicana fomentou pronunciamentos militares mais ou menos apoiados por civis, visando o regresso à "normalidade constitucional republicana". Nestas revoltas estiveram envolvidos dirigentes do Partido Democrático, do Partido Evolucionista, do Partido Socialista e até sidonistas críticos, como Cunha Leal e Machado Santos. Foram derrotados por "forças leais ao Governo". Lisboa e Covilhã renderam-se quase imediatamente e Santarém a 15 de Janeiro.
No dia 19 de Janeiro de 1919 Paiva Couceiro liderou o golpe militar que, no Porto, proclamou a Monarquia e criou a Junta Governativa do Reino, onde figuraram alguns dos nomes mais destacados do movimento realista.
O líder monárquico foi investido regente, a bandeira verde-rubra substituída pela azul-e-branca e a Guarda Nacional Republicana pela Guarda Real. A adesão a esta iniciativa ocorreu noutros locais, embora restrita ao Norte do Vouga e Viseu. Chaves e Aveiro mantiveram-se leais à República.
O governo reagiu de imediato. Desautorizou a Junta Militar do Norte, assegurou a lealdade das forças militares sedeadas em Lisboa, decretou a suspensão das garantias e apelou à colaboração popular na defesa do regime republicano.
A situação complicou-se quando a 23 de Janeiro de 1919 eclodiu o pronunciamento militar monárquico de Monsanto, chefiado por Aires de Ornelas e comandado por Álvaro Mendonça. As iniciativas militares e civis pró-monárquicas ou pró-republicanas sucederam-se um pouco por todo o território continental.
No dia 24, ao fim da tarde, a revolta monárquica foi subjugada na capital, após o assalto levado a cabo por militares e civis comandados pelo coronel Vieira da Rocha. Ainda nessa tarde Canto e Castro passeou pela baixa lisboeta em carro descoberto, sendo aplaudido pelos populares.
A vitória sobre o levantamento provocou a demissão do executivo chefiado por Tamagnini Barbosa (26 de Janeiro). Canto e Castro chamou José Relvas para formar um novo ministério, tentando evitar a transferência do poder para as mãos dos democráticos.
Procurando serenar a situação interna e externa e criar as condições necessárias para uma representação condigna nas negociações internacionais que se seguiram ao armistício, no novo elenco governamental figuraram todos os partidos políticos (Democrático, Unionista, Evolucionista, Nacional Republicano e Socialista), para além de sidonistas independentes. Este "governo de concentração" manteve-se em funções até 30 de Março de 1919.
Os confrontos entre militares e civis apoiantes dos regimes monárquico e republicano continuaram a verificar-se, e a Monarquia do Norte perdurou. No fim de Janeiro o cerco foi-se fechando.
Sucessivamente as forças republicanas foram tomando os locais onde os monárquicos se haviam instalado: Lamego, Estarreja, Oliveira de Azeméis, Ovar, Águeda e Viana do Castelo. Finalmente a 13 de Fevereiro os revoltosos renderam-se no Porto, logo após o contra-golpe da GNR chefiado pelo capitão Sarmento Pimentel, e de civis liderados por José Domingues dos Santos. Em Vila Real os monárquicos resistiram até dia 17 e só no dia 22 foram efetivamente derrotados os últimos focos de rebelião.
A vitória republicana reintroduziu a normalidade constitucional de 1911, interrompida pelo consulado sidonista. Julgaram-se os implicados nas tentativas de restauração monárquica, retomaram-se as liberdades e outras disposições constitucionais que tinham sido suspensas com a tomada de poder por Sidónio Pais.
Os movimentos sociais de combate ao desemprego, à especulação e à diminuição do poder de compra dos trabalhadores assalariados ganharam novamente relevância social e política.
Em Lisboa a grande agitação das classes laborais motivou várias manifestações. No comício realizado no Coliseu dos Recreios a 21 de Fevereiro, exigiu-se a dissolução do Parlamento e a realização de novas eleições. Verificaram-se confrontos com a polícia nas ruas da Baixa de Lisboa e o governo foi obrigado a refugiar-se no Quartel do Carmo. Em Março seguinte o Parlamento foi dissolvido.
A normalidade constitucional foi reposta e novas eleições foram convocadas para o dia 13 de Abril seguinte.
O executivo não sobreviveu muito tempo. Os dois sidonistas que o compunham abandonaram-no a 28 de Fevereiro: Egas Moniz, titular dos Negócios Estrangeiros, saiu a 13 de Março; Carlos da Maia fê-lo a 20. A demissão colectiva do governo foi apresentada no dia 27, mantendo-se em funções até 30 de Março.
A queda do governo significou o fracasso do projecto político preconizado por José Relvas: a formação de bloco conservador que fizesse o equilíbrio de forças necessário com os democráticos. O movimento operário colocou-se momentaneamente ao lado dos democráticos e a figura de Cunha Leal emergiu da crise, disputando, com Relvas, a liderança dos conservadores.
A chefia do novo executivo foi entregue aos democráticos: o bacharel em teologia Domingos Leite Pereira foi o presidente seguinte do ministério. Na formação excluíram-se sidonistas, mas foram integrados unionistas, evolucionistas e socialistas. Manteve-se em exercício até 29 de Junho de 1919.
O esforço de apaziguamento da sociedade foi notório. Ainda antes da mudança de executivo, em Março, Canto e Castro havia promulgado o decreto que autorizou Bernardino Machado a regressar do exílio. Nesse mês ainda, o governo substituiu a delegação portuguesa à Conferência de Paz que decorria em Paris. Egas Moniz deu lugar a Afonso Costa, que veio a assinar, por Portugal, o Tratado de Versalhes, em 28 de Junho de 1919.
Durante os meses de Abril e Maio, com o decreto n.º 5367, o governo extinguiu a Polícia Preventiva, estruturada durante o período sidonista. Criou a Polícia de Segurança do Estado, com funções de "vigilância política e social".
As eleições legislativas realizaram-se a 11 de Maio de 1919. O Partido Democrático saiu vitorioso, elegendo 86 dos 163 deputados e 36 dos 71 senadores. O Parlamento eleito ficou ainda constituído por 38 deputados evolucionistas, 17 unionistas, 13 independentes, 8 socialistas e 1 católico, e por 27 senadores evolucionistas e unionistas, 6 independentes, 1 católico e 1 centrista.
Alegando a eleição do novo Parlamento e o agravamento do seu estado de saúde, o chefe do Estado pretendeu resignar. O documento de renúncia foi apresentado na sessão do Congresso de 3 de Junho. Foram unânimes os pedidos para que reconsiderasse. Tomaram a palavra António José de Almeida, António Maria da Silva, Costa Júnior, Jacinto Nunes, Dias de Andrade e o próprio presidente do Ministério, Domingos Pereira. Canto e Castro desistiu do seu propósito.
A chamada ao governo do Partido Democrático, nos finais do mês de junho, ocorreu numa fase de grande movimentação operária e agitação social. Registaram-se - sobretudo na região de Lisboa - diversas greves em defesa do aumento dos salários, da diminuição dos horários de trabalho, do combate à especulação e ao açambarcamento.
O governo presidido por Domingos Pereira, demissionário desde 12 de Junho, cessou suas funções no dia 29. Tomou posse um executivo chefiado pelo militar Alfredo Ernesto de Sá Cardoso. Todos os ministros foram recrutados nas fileiras do Partido Democrático, mas à excepção de Álvaro de Castro, nenhum tinha experiência governamental. Manteve-se em funções até 21 de Janeiro de 1920.
A atuação do executivo procurou dissuadir a reconstituição do bloco conservador: evitou reeditar conflitos com a Igreja, atuou com prudência na questão dos saneamentos da administração, contemporizou com a eleição de António José de Almeida para a Presidência da República (6 de Agosto de 1919) e com a revisão constitucional que atribuiu ao Presidente da República o poder de dissolver o parlamento.
Muitos outros factos relevantes ocorreram durante o mandato presidencial de João do Canto e Castro: a criação do Partido Republicano Liberal, resultado da unificação dos Partidos Evolucionista e Unionista, cujo programa – concebido por Ferreira de Mira - acentuou o carácter conservador dos programas daqueles dois partidos; a publicação do primeiro número do jornal A Batalha, propriedade da União Operária Nacional (UON), predominantemente anarco-sindicalista e assumindo-se desde o início como "porta-voz da organização operária portuguesa"; a publicação diária do - até à data - semanário O Combate, órgão do Partido Socialista Português, confirmando assim a relativa capacidade de implantação daquela força política de matriz pequeno-burguesa e operária; a assinatura do Tratado de Paz com a Áustria; a transformação da UON na Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), que continuou a ser maioritariamente influenciada pela corrente anarco-sindicalista.
A 5 de Outubro de 1919 João do Canto e Castro passou o testemunho a António José de Almeida.
Visitas de Estado
Durante a presidência de João do Canto e Castro, Epitácio Pessoa, Presidente do Brasil, visita Portugal em 1919.
Retrato Oficial
Henrique Medina pintou o retrato oficial de Canto e Castro no Palácio de Belém, em 1933. O artista improvisou um ateliê e o almirante, já retirado da vida política, deslocou-se ao palácio para posar, tendo recebido a visita do Presidente Carmona.
Com o propósito de constituir uma Galeria dos Presidentes da República, o Governo da Ditadura encomendou vários retratos a Henrique Medina. No mesmo ano pintou o retrato do Presidente Óscar Carmona.
Canto e Castro, com o uniforme da Marinha, ostenta as insígnias de Grã-Cruz da Ordem Militar da Torre e Espada, recebida em 1919: a placa ao peito e a banda azul com pendente.